As primeiras anotações surgiram com a instalação da
Colônia Militar de Jataí, em 1855. Devido à inexistência de uma comunicação
terrestre com a província do Mato Grosso e a ameaça de uma possível invasão
paraguaia, o Barão de Antonina conseguiu na corte do Rio de Janeiro a criação de
uma colônia militar nas margens do rio Tibagi, realizando um trabalho de
aproximação com o indígena. O aldeamento recebeu o nome de São Pedro de
Alcântara, em homenagem ao Imperador e sua direção foi entregue ao Frei Timotheo
Castelnovo. Em frente ao aldeamento indígena, foi fundada a colônia militar de
Jataí (WACHOWICZ, 2010).
Durante a
Guerra do Paraguai, o aldeamento e a colônia facilitaram a subsistência dos
soldados. E os índios, exímios canoeiros, auxiliavam no transporte e na
comunicação. Após o término da guerra, o plano de ligar o Mato Grosso com o mar,
pelo território paranaense foi abandonado. Em consequência, a colônia Jataí não
teve o progresso desejado. Emancipou-se em 1896, tornando-se o município de
Jataizinho. Com o tempo o aldeamento indígena foi anexado à colônia. Esses dois
núcleos foram os primeiros centros de colonização no norte do Paraná (WACHOWICZ,
2010).
A historiografia
tradicional define a colonização do chamado Norte Velho como um prolongamento da
cafeicultura paulista, implementada através da grande propriedade.[5]
Baseando-se no fato de que, no final do século XIX, em decorrência do
esgotamento do solo e de medidas restritivas ao plantio do café, fazendeiros
mineiros e paulistas transpuseram o rio Itararé e ocuparam os vales dos rios
Paranapanema, Cinzas e Jataí (WESTPHALEN et al., 1968; LUZ, 1997). Mas as
estatísticas demonstram que, a expansão cafeeira ocorreu concomitantemente no
norte do Paraná e nas regiões vazias para o capital em São Paulo. Visto que,
entre 1920 e 1930, a produção cafeeira era muito pequena norte do Paraná,
representando 2% do montante do país. Enquanto que, em São Paulo, as safras
alcançavam 69% da produção nacional (TOMAZI, 1997).
Dados do Censo Agrícola
evidenciam que, até 1920, predominava a pequena propriedade, sendo quase 2/3 do
total dos estabelecimentos, que só detinham 16,8% da área total. As médias
propriedades detinham quase 1/3 dos estabelecimentos, com 46,% da área. As
grandes propriedades, acima de 1000 hectares, eram apenas 2,52% dos
estabelecimentos e detinham 36,8% de toda a área. O que permite Tomazi (1997)
afirmar que, até 1920, a (re)ocupação do nordeste paranaense se deu com base na
pequena propriedade (devido ao número elevado de estabelecimentos) e com brutal
concentração da terra, pois 8,27% dos estabelecimentos detinham 56,3% da área.
De acordo com Westphalen
et al. (1968), desde o final do século XIX, quando o controle das terras
devolutas passou para os estados, o governo do Paraná se preocupava em promover
a ocupação e povoamento destas áreas.[6]
Ao afirmar que o território estava desocupado e despovoado, estes e outros
autores omitem a presença dos índios, caboclos e posseiros.[7]
A ideia do vazio demográfico faz parte do discurso oficial, segundo o qual,
povoar um território era torná-lo produtivo, ou seja, integrá-lo aos moldes do
sistema capitalista (TOMAZI, 1997).
Como não possuía
recursos para financiar uma política de imigração estrangeira para expandir a
produção cafeeira e visava eliminar a ocupação ilegal e predatória do solo e das
matas, o Estado promoveu a divisão em lotes e a venda a preços baixos, por
intermédio de concessões a companhias particulares (PADIS, 1981). Em função da
Lei n.º 1642 de 1916, as empresas poderiam receber concessões de até 50 mil
alqueires e deveriam vender as terras, em pequenos lotes de 5 a 25 alqueires, em
um prazo de oito anos, ao fim do qual, caso as demarcações não fossem
realizadas, as áreas voltariam ao Estado[8]
(TOMAZI, 1997). As grandes concessões feitas a particulares na década de 1920,
eram uma das fontes de renda mais promissoras do Estado. Loteadas as terras, os
impostos de transferência rendiam tanto quanto a produção agrícola (CANCIAN,
1981).
Entre estas empresas,
destaca-se a Companhia de Terras Norte do Paraná, fundada em 1924, por capitais
ingleses e vendida a um consórcio brasileiro, em 1944, tornando-se a Companhia
Melhoramentos Norte do Paraná.[9]
Entre 1925 e 1927, a CTNP adquiriu 516.017 alqueires, por dez mil, cento e
sessenta e quatro contos, setenta e nove mil, cento e vinte réis (LUZ, 1997).
Conforme a CMNP (1975), a falta de vias de acesso contribuiu para que o preço
das terras fosse fixado em 20 mil réis por alqueire. Preço equivalente à diária
de um carpinteiro ou ao custo de cinco quilos de feijão. Na mesma época, as
terras roxas de Ourinhos eram vendidas por um valor trinta vezes mais alto. Os
documentos e publicações oficiais omitem os motivos da fixação dos preços em tão
baixo valor, referem-se laconicamente ao preço da lei. Por traz destas
negociatas estava o endividamento do país com os banqueiros ingleses (JOFFILY,
1985).
Em 1923, a Missão
Montagu chegou ao Brasil, tendo em vista um pedido de empréstimo de 25 milhões
de libras, solicitado por Arthur Bernardes a casa Rothschild. Seu objetivo era
analisar a situação institucional e operacional de implementação das políticas
monetária e fiscal que dessem garantias ao empréstimo (JOFFILY, 1985). Um dos
integrantes da missão, o técnico em agricultura e florestamento, Simon Joseph
Frazer, conhecido por Lord Lovat, veio ao Paraná a convite de um grupo de
fazendeiros do Norte Velho, que buscava investidores para concluir a ligação
ferroviária entre São Paulo e o Paraná. Os fazendeiros haviam adquirido
concessões dos dois estados, no início dos anos 20,[10]
construindo a estrada de Ferro Noroeste do Paraná, que se estendia de Ourinhos
até Cambará, mas não dispunham de capital para expandir o trecho de 27 km. Mais
tarde, a ferrovia passou a se chamar Companhia Ferroviária São Paulo-Paraná e
foi comprada pela CTNP (TOMAZI, 1997).
Impressionado pelas
terras roxas, Lord Lovat adquiriu propriedades em São Paulo e no norte do
Paraná, fundando uma empresa para atuar no Brasil, a Brasil Plantations
Sindicate e uma companhia subsidiária, a Companhia de Terras Norte do Paraná
(CMNP, 1975). Embora historiografia oficial sustente que, o objetivo pessoal de
Lovat era plantar algodão, para suprir as indústrias de tecelagem na Inglaterra
(LUZ, 1997; WACHOWICZ, 2010); ele estava a serviço dos Rothschild e não os
abandonaria para tratar de assuntos pessoais. Logo, as terras adquiridas no
Paraná deveriam lastrear supletivamente os débitos nacionais com os capitalistas
britânicos (JOFFILY, 1985).
A área adquirida pela
CTNP, situada entre os rios Paranapanema, Tibagi e Ivaí, era disputada por
grupos antagônicos constituídos por posseiros, grileiros e possuidores de
concessões outorgadas pelo Estado (TOMAZI, 1997). Segundo Hermann Morais de
Barros, se não eliminasse essa contenda, ninguém teria coragem de comprar as
terras. Assim, pagando até três vezes pelas terras, a Companhia assegurou a si
e aos seus sucessores o direito líquido e inquestionável sobre a terra
negociada (CMNP, 1975, p. 59). Grande parte dos autores reproduz a fala da
Companhia:
Quando a CTNP
adquiriu do Estado as terras devolutas, ela se comprometeu a indenizar todos
aqueles que apresentassem títulos de propriedade, o que realmente foi feito.
Alguns poucos posseiros encontrados foram removidos, sendo reassentados em
outras áreas, sob a responsabilidade da própria Companhia. Face a esse
saneamento, não houve conflitos de terras nos domínios da Companhia. Os
conflitos que houve como o de Porecatu, por volta de 1950 estavam fora dos
seus limites (CERNEV, 1988, p. 118).
Para Tomazi (1999,
p.71), a ideia de que a CTNP reembolsou todos que apresentaram títulos de
propriedade é uma pilhéria, porque os posseiros tinham enormes dificuldades em
adquirir estes títulos e os caboclos nem se preocupavam com isto. Na realidade,
a CTNP/CMNP, bem como outras companhias colonizadoras, utilizava-se de jagunços
para sanear as terras compradas. Segundo Lopes (1986), entrevistas feitas com
funcionários do Departamento de Terras indicam que, a CTNP possuía uma força
policial particular que frustrava qualquer tentativa de permanência em suas
terras.
A CTNP colocou em vários
pontos de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, agentes que procuravam atrair
compradores para as terras. Para acelerar as vendas, desenvolveu uma intensa
propaganda com base no slogan: Certeza de lucro e garantia do direito de
propriedade. Atraídos pela a fama do Norte do Paraná, terra onde se anda sobre
dinheiro , milhares de migrantes vieram para a região em busca de trabalho e do
tão sonhado pedaço de chão (LOPES, 1982). A historiografia tradicional explica
fluxo migratório por intermédio da forma de transmissão da propriedade: divisão
em pequenos lotes, vendas a prazo, taxas de juros reduzidas, preço relativamente
baixo da terra, transporte e assistência técnica para os colonos (PADIS, 1981;
LUZ, 1997).
Por ter vendido 40 mil
lotes rurais, cuja área média era de 12 alqueires, a Companhia define sua ação
como um exemplo pioneiro de reforma agrária.[11]
Até os trabalhadores mais humildes, graças à divisão da terra em lotes pequenos
e às condições módicas de pagamento, conseguiram adquirir seu pedaço de chão
(...). E assim a democracia autêntica floresceu no Norte do Paraná, onde a
iniciativa privada realizou uma verdadeira, justa e pacífica reforma agrária
(CMNP, 1975, p. 150).
No entanto, dados
referentes à aquisição de propriedades junto a CTNP demonstram que, a empresa
recebeu, na sua quase totalidade, à vista, os lotes rurais que vendia. Sem
contar que seus preços eram bem mais elevados do que os lotes vendidos pelo
Estado.[12]
O que evidencia que os compradores eram indivíduos com algum pecúlio acumulado
(TOMAZI, 1997). Conforme as estatísticas apresentadas por Cancian (1981), já no
ato de venda, houve uma significativa concentração da propriedade rural, pois
quase 3/4 (72,81%) dos compradores possuíam menos de 1/3 (32,06%) do total da
área e uma minoria expressiva dos proprietários tinha um grande volume de
terras. Portanto, a área da Companhia não foi dividida igualmente em lotes de 12
alqueires.
Logicamente, existiam
muitos fazendeiros na região da CTNP, incluindo os próprios dirigentes dela.
Embora a CMNP e seus apologistas afirmem que, as linhas do empreendimento não se
modificaram quando a CTNP foi transferida à gestão nacional (TOMAZI, 1989);
houve uma reorientação no que diz respeito à divisão das terras em lotes,
aumentando-se o seu tamanho em várias glebas, ao mesmo tempo em que se
dinamizaram as vendas (Cancian,
1981). Segundo Tomazi (1997), a assertiva de que colonização da região resultou
da repartição da terra em pequenas propriedades, é mais um dos elementos do
discurso dominante, que busca diferenciar o Norte Novo, ocupado por pequenas
propriedades, do Norte Pioneiro, colonizado pela grande propriedade.
Segundo Arias Neto
(1998), a representação do norte do Paraná, como um exemplo de Reforma Agrária é
criada quando se esgota o conteúdo das imagens do Eldorado. Processo que se
inicia com as geadas de 1953 e 1955, que descapitalizaram os cafeicultores e
mostraram ao governo brasileiro que não era mais possível manter um plano de
desenvolvimento industrial baseado nos cambiais da cafeicultura. No decorrer da
década de 1960, a cafeicultura foi sendo desalojada por novas atividades
agropecuárias e industriais. E as ideias de Eldorado, de Nova Canaã, do
pioneirismo, da riqueza fácil, da terra onde se anda sobre dinheiro foram se
tornando histórias.
A CMNP
se apropriou do discurso científico e promoveu um sensível deslize para
legitimar seu empreendimento liberal, dispensando qualquer investigação de sua
origem e dos fundamentos que o sustentam. Desta maneira, a ideia de plano
racional de colonização preconizada por Monbeig, adquiriu o estatuto de
fundamento do progresso. Progresso caracterizado a partir da vinculação de
elementos chaves, onde o direito de propriedade está na gênese do plano racional
de colonização, que instaurou uma democracia agrária no norte Paraná (Arias neto, 1998).
A Companhia justifica
seu projeto imobiliário como uma uma missão de elevado interesse público
(CMNP, 1975, p. 8). E silencia a presença do Estado no norte paranaense:[13]
essa fabulosa região prosperou contando basicamente com a organização
objetiva e dinâmica da empresa privada que a desbravou, e com a vontade de
vencer dos que para ela afluíram atraídos pelas perspectivas de liberdade de
empreendimento que se lhe apresentaram (CMNP, 1975, p. 146-148). Deste modo,
cria uma espécie de mito em torno de suas ações. Tomazi (1989), explica que a
função deste mito é o de internalizar valores e atitudes que visam sustentar a
manutenção de uma estrutura social desigual e de uma estratégia de poder, sempre
referida ao passado.
France Luz (1997) e
outros autores afirmam que, o Estado imitou o modelo bem sucedido de colonização
empreendido pela CTNP, passando a lotear suas terras devolutas em pequenas
propriedades, a partir dos anos 40. Porém, vale lembrar que, desde 1916, várias
leis que tratavam de terras dadas em concessão pelo governo, já determinavam que
fossem ser repartidas em pequenas propriedades. Outras empresas, antes da CTNP,[14]
já haviam feito este tipo de loteamento. Ademais, a legislação sempre beneficiou
as empresas, evidenciando que os interesses das companhias e do Estado eram os
mesmos. Por exemplo, quando o Decreto n.º19.688 de 1931 proibiu o plantio de
café em todo país, a CTNP, a CFSP/PR[15]
e o Estado uniram-se, conseguindo junto ao governo federal, que não a proibição
não atingisse o Paraná. (TOMAZI, 1997).
Por fim, apresentamos o
personagem mais famoso da História Regional: o pioneiro. O discurso oficial, ao
se apropriar das imagens míticas do pioneiro como sendo o primeiro a chegar e o
fundador, tenta transformar o passado de pequenos atos em fatos dotados de
significados históricos (Almeida,
1995).
Por pioneiros, designa
Romário Martins, os primeiros grandes proprietários que se estabeleceram na
região de Jacarezinho. Para o historiador, o ethos do pioneiro
misturaria o ímpeto do pionner norte-americano com o dos paulistas em sua
conquista do sertão. Ele faz a apologia dos yankees brasileiros, netos
de bandeirantes , raça de gigantes que dominaram e conquistaram o sertão
agressivo e maravilhoso para o progresso e a civilização. Encontra-se neste
autor, os principais elementos que a CTNP e outras companhias menores, de
iniciativa privada ou estatal, instrumentalizaram em seu discurso colonizador
(BENATTE; TOMAZI, 2011, p.144-147).
Desde o início do
processo de (re)ocupação, tem sido apresentada uma galeria de personagens
intitulados pioneiros , procurando-se enaltecer a figura de determinadas
pessoas e colocar na ação de alguns indivíduos a causa da pujança regional
(TOMAZI, 1999, p.74). No livro comemorativo do cinquentenário da Companhia foram
publicadas as fotos dos pioneiros considerados mais importantes, como se fossem
bustos, para nunca mais serem esquecidos. Portanto, os capitalistas ingleses,
fazendeiros, diretores e funcionários da Companhia são considerados indivíduos
especiais, que possuem visão antecipada da história (TOMAZI, 1989):
O próprio
secretário de Lord Lovat Arthur Thomas está perpetuado em escultura de
bronze, num parque municipal de Londrina, que também leva seu nome. Mais ainda:
até poucos anos a cidade Mandaguari, era denominada Lovat . Este topônimo é
mantido em um distrito de Umuarama. São os ingredientes da idolatria
anglófila... Mal ingressa no curso primário, a criança londrinense aprende a
cultuar as personalidades da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, cujos
nomes figuram na fachada de quase todas as escolas. Seria enfadonho enumerar as
infindáveis consagrações em ruas, avenidas e edifícios (...) (JOFFILY, 1985, p.
112).
Em contrapartida, os
verdadeiros desbravadores, pequenos proprietários e trabalhadores sem terra não
tem nome, nem memória (TOMAZI, 1989). São raros os estudos dedicados aos
pioneiros autênticos, os pequenos agricultores que chegaram à região, atraídos
pela imagem da Terra da Promissão e do Eldorado e pela promessa de lucro
fácil e rápido, mas que tiveram suas trajetórias de vida marcadas por grandes
dificuldades sócio-econômicas (Almeida,
1995). Praticamente nenhum dos capitalistas da Companhia se encaixa nesta
descrição:
Pioneiros são os
homens que veem na frente, descobrindo e destruindo obstáculos e preparando o
caminho para a implantação da civilização. A chegada dos pioneiros nos sertões
ínvios representa o início do progresso. O pioneiro vem para ficar, quando se
desloca, já traz a família e os haveres quando os possui. (...) O pioneiro vem à
procura de terra fértil, encontrando-a, planta sabendo que seu destino será
chumbado àquela gleba, que com o passar dos dias se transforma em um lugar
sagrado para ele e sua família. (...) não raro, só a morte o arranca da gleba
por ele desbravada[16]
(ZORTÉIA, 1975, p. 52-54).
Ao designar como
pioneiros todos que vieram no início da ocupação, o discurso dominante oculta a
diversidade de classe e transmite a ideia de que todos tinham os mesmos
interesses e chances de progredir (TOMAZI, 1997). Deste modo, o papel que os
migrantes estrangeiros e nacionais têm ocupado nos relatos fornecidos pela
História Regional é o de meros coadjuvantes no processo (Almeida,
1995, p.38).
A maioria destes
migrantes anônimos foi expulsa da região nos anos 70. As terras devolutas haviam
se esgotado, cafeicultura entrava em decadência e o governo incentivava os
programas de erradicação, que liberavam enormes contingentes de mão-de-obra[17]
(SERRA, 1991). Estes trabalhadores rurais acabaram sendo atraídos por outro
discurso que a afirmava que a Terra da Promissão encontrava-se um pouco mais
além, no Paraguai, em Rondônia ou no Mato Grosso, construído pela propaganda de
outras companhias colonizadoras que vendiam a mesma mercadoria: a felicidade e a
riqueza. Mesmo assim, a historiografia tradicional silenciou as transformações
na agricultura regional, procurando restabelecer uma realidade anterior pela
simples narrativa, afirmando que a região continuava a ser um Eldorado (TOMAZI,
1999).
Bibliografia
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CANCIAN, Nadir Apparecida. Cafeicultura paranaense (1900-1970). Curitiba:
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CERNEV, Jorge. Liberalismo e colonização: o caso do Norte do Paraná. Rio
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WACHOWICZ, Rui Christovam. História do Paraná. Ponta Grossa: UEPG, 2010.
ZORTÉA, Alberto João. Londrina através dos tempos e crônicas da vida.
São Paulo: Juriscredi, 1975.
[1]
O termo (re)ocupação é tomado de empréstimo de Nelson Dacio Tomazi.
Segundo Souza (2008), Tomazi define a colonização do norte do Paraná,
como ocupação de uma região já ocupada. Ainda que os colonizadores
tenham insistido na ideia de pioneirismo, de desbravamento de uma
floresta inóspita e desabitada; este fenômeno foi constituído a partir
de um processo violento de entrada em um território habitado por índios
e posseiros. Com a expulsão destes habitantes e sua exclusão dos relatos
sobre a colonização, consolida-se uma história dos vencedores através da
ocultação da presença dos vencidos.
[2]
Mestranda em História, pela Universidade Estadual de Maringá.
[3]
Há uma reiterada identificação da região norte com a terra roxa.
Discurso que parte da questão do solo para homogeneizar o social, o
econômico e o político, silenciando a diversidade real. É importante
conhecer os tipos de solo, para desmistificar a concepção de que estas
terras estão entre as mais férteis do mundo. No Paraná existem dois
grandes blocos de solo: os argilosos e os arenosos, estes de menor
fertilidade que aqueles. Entre os argilosos encontram-se os solos
derivados do basalto e entre estes há os mais férteis e os com toxidade
(TOMAZI, 1997). No noroeste do Estado predomina o Arenito Caiuá.
[4]
Até a década de 1950, circulavam em Londrina apenas três jornais: o
Paraná-jornal, O Município e o Paraná Norte, que ostentavam
páginas inteiras pagas pela Prefeitura ou pela CTNP (Joffily,
1985).
[5]
Esta ideia consolidou-se devido ao discurso promovido pela CTNP, que
visava demonstrar que o processo de comercialização de sua área era novo
(TOMAZI, 1999).
[6]
A Constituição Federal de 1891 transferiu o domínio das terras devolutas
da União para os Estados. Em 1882, o Presidente do Estado do Paraná,
Francisco Xavier da Silva, publicou a Lei n.º 68, sobre os serviços de
registro, validação, legitimação, venda, aforamento, discriminação e
colonização de novas de terras, por empresas nacionais ou estrangeiras
(WESTPHALEN et al., 1968).
[7]
Sobre os indígenas no norte do Paraná, ver: MOTA, Lúcio Tadeu; NOELLI,
Francisco Silva. Exploração e guerra de conquista dos territórios
indígenas nos vales dos rios Tibagi, Ivaí e Piquiri. In: DIAS, Reginaldo
Benedito; ROLLO GONÇALVES, José Henrique (orgs.) Maringá e o Norte do
Paraná: estudos de história regional. Maringá: EDUEM, 1999. A
respeito dos posseiros, indicamos: PRIORI, Angelo. O levante dos
posseiros: a revolta camponesa de Porecatu e a ação do Partido Comunista
Brasileiro no Campo. Maringá: EDUEM, 2011.
[8]
Em 1919 foram efetuadas várias concessões na região norte: a Corain e
Cia e Leopoldo Paula Vieira, no município de São Jerônimo, a Augusto
Loureiro, James Cody Terry e Percy James Allen, no município de Tibagi.
Entre 1920 e 1921, em Tibagi, foram feitas as concessões a Jacob Petry e
Cia., José Hauer Junior, Geniplo dos Santos Pacheco e a Antônio Alves de
Almeida. Após a promulgação da Lei n.o 2125 de 1922; que
diminuía o prazo de demarcação das terras para dois anos; foram cedidas
em São Jerônimo, as concessões a João Leite de Paula e Silva e à União
Cooperativa Humanitária do Brasil, depois transferida a Manoel Firmino
de Almeida. Em Tibagi, a José Carvalho de Oliveira que passou a Casemiro
de Souza Lobo; a Hacker e Cia. A maior das concessões foi a da Companhia
Marcondes de Colonização, Indústria e Comércio S.A., nos municípios de
São Jerônimo e Tibagi. Nas imediações de Paranavaí, foi feita uma grande
concessão, denominada da Gleba Pirapó, à Companhia Brasileira de Viação
e Commercio, que tinha outras reservas a oeste desta gleba, limitadas
pelos rios Paranapanema e Ivaí (TOMAZI, 1997).
[9]
Graças a uma conjunção de fatores: o governo nacionalista que vetava a
propriedade de terras a estrangeiros e onerava, com impostos, capitais
estrangeiros aplicados no Brasil; o decreto de 1939, que encampava a
Ferrovia São Paulo-Paraná embora a transferência só fosse efetivada em
1944, quando as terras foram passadas ao grupo nacional ; e a venda de
terras que não atingiu o esperado, somente 19,7% da área total adquirida
pela CTNP, compreendendo 110.481 alqueires (TOMAZI, 1997).
[10]
Nesta época, as relações comerciais e financeiras do norte do Paraná
realizavam-se mais com São Paulo do que com Curitiba, graças a vários
fatores: a ferrovia Sorocabana se aproximava da divisa com o Paraná; as
condições de comercialização no porto de Santos eram mais satisfatórias
e as casas comissárias de café lá estavam instaladas; havia muitos
paulistas que tinham adquirido terras no Paraná e tinham ligações com
casas bancárias que financiavam a produção e no Paraná inexistia um
sistema adequado de transporte para escoar a produção (TOMAZI, 1997). Em
consequência, Padis (1981) afirma que, a economia do norte do Paraná se
desenvolveu de forma periférica e dependente do Estado de São Paulo.
[11]
No início dos anos 1960, diante dos debates nacionais sobre a Reforma
Agrária, a colonização empreendida pela CMNP foi citada pelo jornal O
Estado de São Paulo, como modelo para se efetivar a ocupação de
terras no Brasil (TOMAZI, 1989). Os depoimentos presidente da empresa,
parte dos pressupostos do liberalismo clássico para criticar o
intervencionismo estatal na questão agrária. Hermann Moraes de Barros
defendia que, somente através de um plano de colonização, seria possível
desenvolver uma reforma agrária racional, mantendo-se a livre
iniciativa, o direito de propriedade e a lei da oferta e da procura.
Cabendo ao Estado somente auxiliar onde sua presença fosse importante
para consolidar a iniciativa privada (ARIAS NETO, 1998).
[12]
As colônias estaduais tiveram uma grande procura, pelo fato de seus
preços serem bem mais convidativos que os da CTNP e porque as terras
eram de boa qualidade e inexploradas em culturas extensivas, como o café
(TOMAZI, 1997). Em 1931, o preço mínimo de terras devolutas no norte do
Paraná era de 43$560 o alqueire e poderiam ser vendidas por preços
inferiores ao mínimo estabelecido. Os preços da CTNP variavam de 400$000
a 600$000 por alqueire (CANCIAN, 1981).
[13]
O governo criou várias colônias no norte do Estado, como Içara (1941),
Jaguapitã (1943), Centenário (1944), Interventor (1950) e Pagú (1950),
na antiga concessão Alves de Almeida. E Paranavaí (1944), na antiga
concessão dada à Companhia Brasileira de Viação e Commercio. Quase todas
fazendo divisas com as terras da CTNP ou de outras colônias particulares
(TOMAZI, 1997).
[14]
A ideia inicial era vender terras para fazendeiros. Os ingleses só se
decidiram pela pequena propriedade ao perceberem que auxiliariam na
formação de pequenos povoados com mercados e, portanto, carga para a
Estrada de Ferro São Paulo-Paraná (TOMAZI, 1997).
[15]
Companhia Ferroviária São Paulo-Paraná.
[16]
Depoimento de Álvaro Godoi, um dos mais antigos e bem sucedidos
fazendeiros do norte paranaense, político da UDN e um dos líderes dos
movimentos de cafeicultores da região (Arias
Neto, 1998).
[17]
Os espaços liberados pelas lavouras cafeeiras foram sendo gradativamente
ocupados por novas formas de cultivo, surgindo em primeiro lugar o
algodão e em seguida o consórcio de culturas mecanizadas de soja e trigo
e as pastagens plantadas. Ao contrário do café, que em todas as suas
fases de produção era dependente de mão de obra braçal, os novos
cultivos dispensaram o fator mão de obra, com exceção do algodão, o que
fez aumentar o contingente de trabalhadores desempregados (SERRA, 1991).
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